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A falta
de renúncia no indivíduo dá testemunho de que as atrações terrenas estão ainda
falando alto no seu íntimo. Os renunciados são aqueles para quem os prazeres
mundanos estão sepultados. Para estes, nenhum temor os atinge. O renunciado
consciente não é um desiludido, um apático, um indiferente, mas um convicto na
vida eterna, no poder supremo, na evolução da alma. Sabe distinguir o efêmero
do permanente, o ilusório do realismo, a vida espiritual da material.
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A
crosta da Terra está em constante transformação. Rios mudam o seu curso; terras
emergem, enquanto outras descem para o fundo dás águas; cidades desaparecem
corroídas por influências telúricas, ou soterradas por tremores sísmicos; os
seres deixam os seus corpos físicos para que estes sejam transformados em pó, e
de cada indivíduo milhares desses corpos sofreram essa decomposição.
No
entanto, ninguém sente apego por eles, porque a sua memória está apagada na
voragem dos tempos que foram; portanto, nada justifica o apego às coisas
passageiras, que são todas de ordem material. O renunciante venceu o apego, por
saber que não vale a pena prender‑se às coisas que hoje são, e amanhã deixam de
ser.
Isto
mostra a precariedade das posses terrenas. Não se deve, pois, ter apego ao que
é precário, ao que é da Terra e na Terra fica. A alma do renunciante está
voltada para o que não perece nunca, para o tesouro do espírito, para a
grandeza da evolução universal.
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Somente
aqueles que possuem pleno espírito de renúncia, estão habilitados a prosseguir
na sua evolução, sem necessidade de reencarnar neste planeta. Ao contrário, os
que sentem que a Terra ainda lhes pode oferecer algo que desejam experimentar,
estão ligados ao sentimento de apego e deverão voltar para satisfazer tal
anseio.
O
desejo é uma força que pede consumação , e os que estão apegados a alguma
ansiedade terrena, desejam viver na Terra até se saturarem dela. Daí a
necessidade de haver reencarnações, para que todos se possam saturar das
ilusórias oferendas que a Terra tem para distribuir.
Nessa
saturação entram em jogo o egoísmo, a vaidade, a presunção, a pretensiosidade,
o orgulho, a ostentação, a prepotência e demais atributos negativos, até que
todos sejam queimados no cadinho do sofrimento. O renunciado passou por toda
essa prova e superou esse estado de inferioridade espiritual em que se encontram
os apegados.
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Para
saber‑se se o indivíduo ainda é candidato, por muitas encarnações, ao retomo à
Terra, um dos meios é examinar ele o seu interior, para verificar se lá,
escondido, não se encontra um desejo ou uma atração terrena na dependência de
serem satisfeitos.
Uns
querem viver, ainda, num palácio; outros desejam cargos importantes; há os que
anelam receber ovações das platéias; o sentido da ostentação predomina em
muitos, e a vaidade, noutros, desperta ansiedades não correspondidas.
Estes,
por não terem atingido o estado da renúncia, devem voltar à Terra, talvez
muitas vezes, para esgotar nela as quiméricas aspirações.
O
renunciante sente, no seu íntimo, que a verdadeira felicidade repousa em
motivos eternos, e não nos acontecimentos efêmeros, passageiros e ilusórios.
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A
renúncia atesta um estado de evolução superior àquele dos que a não possuem ou
a demonstram em menor parcela.
Jesus,
por ter oferecido, além das palavras, exemplos, foi um renunciado pleno das
ofertas do mundo. Podendo, pela sua inteligência e saber, conquistar tudo
quanto dispõe o poder temporal, deixou-se ficar, com a sua túnica e as suas
sandálias, na companhia de humildes pescadores.
É que
ele veio, apenas, dar esclarecimento aos homens, sem se importar com o que a
Terra lhe pudesse oferecer. Apresentou, assim, um alto padrão da renúncia, para
que todos a possam reconhecer.
Não
significa esse exemplo que os que seguem os seus ensinos, revividos pelo
Racionalismo Cristão, devam andar de túnicas e sandálias, rodeados de
pescadores. O panorama daquela época não é o de hoje. Dois mil anos nos separam
daquelas paisagens. O que não sofreu alteração, e nem pode sofrer, é o espírito
de renúncia, que é abstrato e íntimo. Esse espírito acompanha o seu possuidor,
como atributo indestacável da sua natureza espiritual.
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Jesus,
se hoje estivesse em corpo físico, neste ambiente terráqueo, teria que vestir‑se
como qualquer outro, usar o trem, o automóvel ou o avião para a sua locomoção,
e habitaria onde, e como melhor lhe conviesse, uma tenda ou um palácio, sem
abdicar, em hipótese alguma, do seu imanente espírito de renúncia.
Os
atributos espirituais conquistados o foram para a eternidade, não havendo a
menor possibilidade de perdê‑los. Por isso, o renunciante, depois que adquiriu
esse tesouro, que é a renúncia, terá tal riqueza ao seu dispor, por todo o
sempre.
O valor
da renúncia só o conhece quem o possui porque não é gênero que se possa dar a
saborear.
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Renuncia,
na vida terrena, quem deixa altruisticamente o melhor para o seu semelhante;
quem sacrifica o seu bem‑estar em favor de quem dele mereça e mais precise, sem
fazer‑se de mártir: o pai que restringe os seus benefícios em prol da saúde e
melhor educação dos seus entes; a mãe que moureja ao lado dos seus rebentos,
para que nada lhes falte ou de mal aconteça; renuncia aquele que se priva do
bem que merece para atender a um labor de aproveitamento coletivo; aquele que
venceu, totalmente, o apego às coisas da Terra; aquele que põe de lado as suas
conveniências, quando considera maiores as da comunidade; aquele que se sente
satisfeito com o que tem, sem deixar, contudo, de se esforçar por melhorar e
progredir em todos os terrenos; aquele que não sente mossa na alma pelo que os
outros possuem de melhor; aquele que sabe que não pertence a este mundo.
A
renúncia retempera a alma diante dos sucessos ou insucessos. O renunciante
encara a vida com serenidade, não exagerando os fatos. Olha para o futuro, sem
temor, porque as perdas materiais têm, para ele, valor relativo. A sua
estrutura espiritual é vigorosa e ativa; é um ser esclarecido.
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Almas
renunciadas do Astral Superior trabalham em corpo astral, junto do orbe, e
somente encarnam em missões especiais. As vibrações do mundo não produzem nelas
o menor atrativo, não se comprazendo com os gozos terrenos, visto como, além da
própria índole, mantêm contato permanente com esferas mais altas, de onde lhes
vêm influências para maior apuração dos sentidos.
As
almas hoje renunciadas obtiveram o espírito de renúncia neste mundo‑escola, de
encarnação em encarnação, aos poucos, com paciência e perseverança.
Muitos
há na Terra que se encontram, já, com bom acervo desse predicado, enquanto
outros se mostram pobres dele; é que os primeiros mais próximos se acham de uma
vida nova, em outro mundo melhor, enquanto que os segundos precisam estagiar,
por mais tempo, nesta oficina terrena.
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O
objetivo do Racionalismo Cristão é apontar o caminho; e revelar os pontos que
deverão ser atingidos na senda da espiritualidade. A renúncia é uma dessas
metas. Quanto mais for dado realce a esse
aspecto do problema, tanto melhor será ele encarado e resolvido. Muitos
custarão a despojar‑se das teias que os amarram às idéias de posse, mas o
importante é reconhecer o estado do seu próprio espírito, e caminhar, com
segurança, sobre a rota da emancipação.
Todos
estão na Terra para se espiritualizarem, e se ela não estivesse preparada para
fornecer os meios para esse fim, então seria uma estultícia virem os espíritos
a encarnar nela, onde perderiam tempo. Mas como não há nada mal feito no
Universo, e tudo obedece a leis sábias, é debaixo dessa ordem que os seres vêm
à Terra para se espiritualizarem. Entre as várias matérias que o curso terreno
oferece para a criatura alcançar aquele resultado, está o aprendizado da
renúncia. Logo, quanto mais depressa for absorvida a lição, tanto melhor.
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O
Racionalismo Cristão é como que um facho de luz que ilumina, graciosamente, a
estrada. Os seus servidores deixam de lado as diversões, o comodismo, o bem‑estar,
para servir à Causa e, abnegadamente, ajudar os que querem ver com os olhos da
alma as realidades da vida, numa sincera e honesta demonstração de renúncia.
A Renúncia
Por Luiz de Souza
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